Por g1 BA
Área ocupada a partir das buscas de ouro e pedras preciosas no final do século 16 e por conta da criação de gado no sertão baiano, o norte da Bahia teve uma grande presença de pessoas negras escravizadas que chegavam à região trazidas por portugueses e colonos. Séculos depois, a ação ainda permanece na região.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou, nesta quinta-feira (27), dados da pesquisa Brasil Quilombola, que integra o Censo Demográfico de 2022.
E os números divulgados apontam que a cidade do Brasil com maior população quilombola é baiana e do norte do estado: Senhor do Bonfim, que tem 15.999 quilombolas. O município é um dos cinco baianos que aparecem entre as dez cidades do país de maiores números de quilombolas.
Em meio ao sertão do norte baiano, Senhor do Bonfim tem 74.490 pessoas, de acordo com o Censo de 2022, e ocupa a 24ª colocação no estado, 100ª na região Nordeste; e 438ª no Brasil. A cidade tem densidade demográfica de 94,37 habitantes por km² e uma média de 2,76 moradores por residência.
Em Senhor do Bonfim, a maior parte das comunidades quilombolas são certificadas pela Fundação Palmares, do governo Federal, entre elas, as do Laje e Mamoeira, Tijuaçu, Cariacá, Água Branca, Olaria, Quebra-Facão e Umburana. Antes de ser emancipada no final do século 19, a cidade era uma vila que pertencia à cidade de Jacobina, famosa por suas minas de ouro.
“Viver em uma comunidade quilombola é lutar intensamente pelos seus direitos e buscar melhorias para o seu povo. É lutar pela por uma educação de qualidade, por uma saúde de qualidade, por uma habitação, pela regularização fundiária de suas terras, além de buscar o reconhecimento, e integrar uma luta intensa contra o preconceito racial”, conta Valmir dos Santos, do Conselho Estadual das Comunidades Quilombolas da Bahia e morador da comunidade quilombola de Tijuaçu.
Valmir destaca ainda a quantidade de quilombos na cidade de Senhor do Bonfim e o papel destas comunidades em uma luta nacional. De acordo com ele, o compartilhamento de informações tem ocorrido entre as comunidades para ampliação da articulação.
“Em Senhor do Bonfim, nós temos vinte comunidades quilombolas. Nós do Tijuaçu temos contribuído com as outras comunidades quilombolas da região norte da Bahia em um trabalho de orientação. É importante saber que de lá partiu a contribuição para a fundação do Conselho Estadual das Comunidades Quilombola, do Conselho Regional das Comunidades Quilombola, e o Instituto Brasil Quilombola”, destaca a liderança.
Quilombo do samba de lata
O Território Quilombola de Tijuaçu tem cerca de 900 famílias, e é considerado o maior em número de remanescentes de quilombo na Bahia, em uma área de 8,4 mil hectares de terras. Ele foi reconhecido pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) em 2014.
Os moradores de Tijuaçu costumam se vestir de forma particular, com trançados diferenciados e uso de torço. O samba de lata é um exemplo de tradições culturais que são ferramentas importantes para a manutenção da história local.
A tradição remonta ao passado da comunidade, fundada por três mulheres negras escravizadas que fugiram de uma senzala no Recôncavo Baiano. Segundo a história local, elas pararam para descansar à beira de um pequeno lago e começaram a viver ali.
No entanto, após uma forte seca por volta de 1932, a comunidade andou por muitos quilômetros para conseguir água. E sempre carregando latas vazias para enchê-las. Enquanto seguia em busca do objetivo, o grupo cantava e batucava nas latas, dando origem à manifestação cultural que manteve o grupo unido e esperançoso em meio à seca e a escassez de alimento.
Além dos quase 16 mil habitantes de Senhor do Bonfim, a cidade vizinha, de Campo Formoso tem outros 12.735 habitantes quilombolas, o que destaca a região. Oitava maior cidade de população quilombola do país, Campo Formoso abriga o Laje dos Negros, um dos principais do país, cujo território passa por outras cidades, como a própria Senhor do Bonfim.
Desde 2010, as duas cidades, além de Filadélfia, Antônio Gonçalves, Nordestina, Mirangaba, e Pindobaçu integram do Conselho Regional de Comunidades Remanescentes de Quilombo da Região de Senhor do Bonfim – Norte da Bahia, que abarca representantes das comunidades tradicionais e discute políticas públicas voltadas para esses moradores.
Essa é a primeira vez na história do Censo Demográfico, em que população quilombola pode se autoidentificar. A Bahia tem, atualmente, uma população estimada de 397.059 quilombolas. O que representa 2,8% da população total do estado que é de 14.136.417 pessoas.
Censo de 2022 mostrou que:
– O Brasil tem 1,3 milhão de pessoas que se identificam como quilombolas. Isso corresponde a 0,65% da população total do país;
– O Nordeste concentra quase 70% dos quilombolas, com grande destaque para os estados da Bahia e do Maranhão. Juntos, eles têm 50% dos quilombolas do país;
– Mesmo com essa concentração, há quilombolas em todas as regiões do país e em quase todos os estados — com exceção de Roraima e Acre;
– Das 5.568 cidades do país, 1.696 têm moradores quilombolas (30,5%);
– Dessas quase 1,7 mil cidades, apenas 326 têm territórios quilombolas delimitados.